Ética Versus Baixaria: Controlar não é Censurar
Audiência, censura, baixaria, cidadania, Direitos Humanos, sociedade civil, governo, televisão, gêneros televisivos.O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Um fim bem promissor para a televisão brasileira
João Pessoa – PB, Jun/2005
George Martins da Silva
RESUMO:
Este texto se destina a, tomando como base todas as publicações consultadas, analisar e expor alguns fatos inerentes à qualidade dos gêneros televisivos no Brasil. Apresenta informações precisas e também fatos nem tão concisos. Não abre para debate, mas toma partido por um lado da sociedade que deveria ter total interesse no assunto mas se mostra completamente apático ao tema. Dá ênfase aos programas propostos a atuar neste sentido, como o a campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania” e o Projeto de Lei que prevê instituir um controle maior sobre os meios de comunicação.
Palavras-Chaves: audiência, censura, baixaria, cidadania, Direitos Humanos, sociedade civil, governo, televisão, gêneros televisivos.
1. Ética Versus Baixaria: Controlar não é Censurar
Desde sempre, a corrida pela audiência, fez, das emissoras de televisão um ambiente propício às coisas mais sórdidas a que se possa imaginar.
Concorrência que deveria ser um empulso para a criatividade dos apresentadores de programa e diretores, principalmente os de programas de auditório, tem agora uma roupagem diferenciada, onde a corrida pelo ganho de audiência, que é medida hora a hora, explora o que de mais baixo há nas tevês brasileiras.
Não é difícil identificar os programas, ou lixos televisivos, dos quais este texto se refere. Quem não lembra dos testes de DNA nos programas do Ratinho, que levava a humilhação plena aqueles que, por um pouco de dinheiro, se expunham a tal teste, ou os escândalos dos programas da Márcia Goldsmith, ou ainda a gravação ameaçadora do PCC a apresentadores concorrentes e autoridades, exibido no programa Domingo Legal do Gugu?
O pensamento de que tudo pode ser imposto à sociedade, que a programação deve ser ingerida sem contestações, sem imposições e sem responsabilidade alguma com a qualidade dos gêneros televisivos, que se esconde num suposto medo de que qualquer um que proponha um certo tipo de controle sobre o que deve ou o que não deve ir ao ar possa ou deva ser taxado de simpatizante da Censura, e ai se faz um trabalho de terrorismo em cima dessa concepção muito ferrenha, mudou a cara da televisão, sobretudo na ultima década.
Tanto os que são usados diretamente por esses programas, geralmente pessoas de baixa renda ou com pouca instrução, que se submetem a tais ridicularizações devido suas condições econômicas, como nós, espectadores que, muitas vezes, nem temos escolha, a não ser desligar o aparelho de tevê, sofremos com esse descaso. Os proprietários de concessões publicas, que se acham donos da televisão no Brasil, têm sim que ser punidos de alguma forma e que se chegue, inclusive, a perda da consessão, mas se tratará disso mais tarde.
Sobretudo, essa idéia de que a sociedade deva engolir tudo o que lhe é imposto vai abaixo, se considerarmos que a própria sociedade se organiza e, dentro de suas condições, inclusive de crítica ao que recebe, procura meios de denúncia, tirando do ar ou mudando horários de alguns desses programas.
Não falo de coisas irreais, ou de fatos isolados.
Peguemos ou tomemos como base, a campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania” promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, que tem a frente o deputado federal Orlando Fantazzini, do PT de São Paulo.
A parceria com mais de 50 entidades, as mais de 2500 manifestações dos cidadãos são prova disso.
Essa campanha chama a atenção por dois motivos: o primeiro, faz um apanhado de denúncias, investiga, tira conclusões e as apresenta a patrocinadores ou empresas que mostram seus produtos na tevê e usam programas de televisão para vender mais. Estas denuncias podem ser feitas através do site da campanha (http://www.eticanatv.org.br) ou pelo telefone 0800 619 619. O segundo motivo, pelo efeito que ela se propôs a fazer e fez, uma vez que, na maioria dos casos, os próprios patrocinadores exigem mudanças no programa ou simplesmente deixam de patrocinar os tais, ou ainda, a reação dos “donos da TV” que contra-atacam exibindo em parte desses programas um tipo de denuncia ou chamados aos seus telespectadores, taxando, como foi dito acima, a campanha de um retrocesso da sociedade e dos órgãos públicos, uma volta a censura. Ameaças, inclusive, não faltaram aos coordenadores dessa campanha. Mas, estes não se intimidam e continuam na luta pela democratização da comunicação.
Numa nota publicada no Jornal Brasil de Fato, por Aiuri Rebello, em 10 de Junho de 2004, o contra-ataque ao qual me refiro, fica bastante explicito. No dia 13 de Maio do mesmo ano, a Rede Record envia carta ao corregedor da Câmara dos Deputados afirmando que o Deputado Orlando Fantazzini cometeu abuso de poder quando pediu para que a empresa Casas Bahia reavaliasse sua estratégia de anunciar no programa Cidade Alerta. Empresa, que por sinal, não se dispôs a tirar os anúncios do ar. Em 29 de Abril, a Rede Bandeirantes tomou a mesma atitude contra o Deputado coordenador da campanha.
Mas não apenas os programas de auditório são campeões de baixaria na TV do Brasil. Os telejornais policiais, como os da Record, ou, tomando como exemplo local, o Correio Verdade, apresentado pelo atual Prefeito da cidade de Bayeux-PB, Jota Junior, são um bom exemplo de lixo da televisão. Nesses casos, a apologia ao crime, ao uso de drogas e a prostituição também são bem visíveis. Com uma programação altamente anti-ética, esses telejornais, se é que assim podem ser considerados, jorram milhares de litros de sangue nos chãos dos lares brasileiros, usam de imagens de crianças e/ou pessoas num momento de aflição ou de desespero total, suas condições sub-humanas e coisas relacionadas, para puxar audiência e vender, vender muito, e, no caso do jornal local citado, vendeu-se até uma imagem de homem público para uma campanha eleitoral, dando resultado satisfatório. Não para mim!
Além destes, outros gêneros foram, por muitas vezes citados como, no mínimo, anti-ético, nas denuncias formuladas à campanha: As telenovelas.
Só pra se ter uma idéia, no ranking divulgado em 11 de Maio de 2004, que apurou denuncias do dia 13 de Janeiro à 7 de Maio, duas novelas se sobressaíram aos demais denunciados: Celebridade em 1º lugar e Kubanacan em 2º. Elas foram consideradas impróprias para os horários em que eram exibidas.
As duas primeiras colocadas neste ranking já haviam ficado entre os três primeiros lugares num outro ranking divulgado no dia 17 de Novembro de 2003, que colheu denuncias do dia 24 de Setembro ao dia 12 de Novembro daquele ano, quando outras novelas também foram apontadas.
Como se não bastasse fugirem totalmente da responsabilidade de educar, incentivar a cultura e as manifestações artísticas, conforme manda a Constituição Federal no seu artigo 221, as proprietárias de concessões públicas de TV inserem uma quantidade insuportável de merchandising, incitam a violência, o crime e o preconceito e têm um apelo sexual bastante elevado, num ato de desrespeito total aos valores éticos da família.
Não serei radical ao ponto de não reconhecer que as telenovelas têm dado um trato um tanto quanto especial a alguns problemas da sociedade de uma forma geral, como, aborto, gravidez na adolescência, crianças desaparecidas, etc., mas o problema está justamente ai, a informação é passada através da concepção de quem as escreve, sem sequer promover um debate amplo, coisas que não serão aprofundadas aqui.
Do mais simples programa, ao mais complexo, até se falando em questões de financiamento próprio mesmo, o descaso e o desrespeito são gravíssimos. E nesse contexto não foram nem inseridos os ‘Reality Shows’.
Mas, o que fazer então? Desligar de fato, a TV? Claro que hoje a grande massa de telespectadores não se dispõem, até por uma questão de comodismo, imposta pela grande rede que é a Indústria Cultural e aceita por muitos, cabisbaixos, a sair de seus lares, da sua poltrona e se deslocar até pontos turísticos de suas cidades, conhecer outras realidades, ou uma realidade, ler um livro ou procurar por informações, achando que o que o Jornal Nacional diz sobre a ‘invasão do MST’ é, sobretudo, verídica, ou imparcial. Então, qual o papel do comunicador ou dos órgãos públicos neste momento? Se não o de denunciar, ficar de boca calada com certeza não é.
Há um projeto de lei tramitando na Câmara dos Deputados, o 1.600/2003, apresentado em 31 de Julho de 2003, de autoria do Deputado Federal já citado aqui neste texto, Orlando Fantazzini, e que tem como relatora a Deputada Federal Ângela Guadagnin, do PT-SP, que institui o Código de Ética para a Programação Televisiva Brasileira e que ganhou proporções gigantescas depois da tão comentada entrevista do PCC ao programa Domingo Legal, ao Gugu Liberato. Este projeto tem foco, sobretudo devido a ligação forte com a campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, nos direitos humanos, o direito do cidadão, que sofre ataque em três frentes: violação da privacidade, divulgação não consentida da imagem e o dano à imagem pública e por isso encontra-se na Comissão de Seguridade Social e Família e tendo sido apreciada pelas Comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e Constituição e Justiça e de Redação, em Agosto de 2003.
Outras ações vêm sendo tomadas a este respeito. A Procuradoria Geral da República e o Ministério Público tentam a todo custo, negociar com as emissoras, um pacto anti-baixaria, propondo assinaturas de termos de compromissos com a civilidade na programação, segundo o que foi publicado em 30 de Julho de 2004 na Folha de São Paulo, pelo colunista Daniel Castro, porém, aos meus péssimos olhos críticos, isso não passa de uma tentativa do Governo de amenizar a situação, onde ele próprio não tem o controle e aparenta muita fragilidade às pressões das redes de televisão, já que, com este acordo, o governo se proporia a “não encaminhar à Procuradoria Geral da República todos os excessos detectados pelo Ministério da Justiça em seu monitoramento da programação, e também todas as reclamações feitas por telespectadores à campanha do Deputado Fantazzini”.
Ainda em 2003, o presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação Social da Câmara, o deputado Coraultti Sobrinho do PFL-SP realizou um seminário sobre ética na TV, onde ficou bem claro que é preciso estabelecer regras aos meios de comunicação e acabar com essa ‘bagunça e desmandos dos donos das TVs’. Mas, será que no estado atual de inter-dependência entre a televisão privada e os órgãos regulamentadores, ou o Governo, será possível fazer esse debates virarem Leis?
Essa relação de dependência do poder público com a televisão, ou vice-versa, é bem notório, se acompanharmos de perto, por exemplo, a trajetória do Jornal Nacional, da Rede Globo, ou dos seus tantos outros noticiários diários. Até o inicio de 2002, Lula como presidente do Brasil era coisa que deveria ser combatido pela rede a qualquer custo. Suas informações, seus comentários e ganchos sempre traziam em si, um certo ar de preconceito contra o nordestino, semi-analfabeto, de “esquerda” e Petista, dando ênfase aos candidatos da direitona, como aconteceu com Fernando Collor, em 89, ou com o Plano Real que elegeu Fernando Henrique, em 94. Porém, a direção do barco vira completamente. De repente, a maior emissora do Brasil pune seus funcionários que fazem propaganda eleitoral para o candidato José Serra, desiste de jogar no ar entrevistas e notas forjadas como as que derrubaram Lula em 89 e começa a disputar a campanha do atual presidente com tanto fervor que até nos dava um certo medo. O que estava por trás? Simples, era mais do que certo a insatisfação de toda a população brasileira, a classe média já não agüentava mais os desmandes intervencionais dos EUA, FMI e neoliberalismo e via no candidato do PT a grande esperança, e como isso não seria mais possível de se reverter, teve que jogar o jogo do então futuro presidente, afinal, com uma dívida de mais de R$ 2 bilhões, não dá pra ser inimigo do governo, não é? Em contrapartida, o então eleito presidente do Brasil, Lula da Silva, seu medo de uma derrubada do Governo, se confunde com os donos do Poder, não resiste a pressão dos donos de emissoras, principalmente às do, hoje defunto, Roberto Marinho e se distancia de sua história e da população, se atrela ao descaso e se aprofunda no comprometimento com as grandes redes nacionais.
Essas explanações sobre o grande dilema político das eleições de 2002 fez-se necessário para a apresentação do contexto geral do assunto entidades privadas, nesse caso, a televisão, e governo, principalmente o federal.
Todo esse atrelamento entre ambas as partes pode dificultar talvez até a aprovação do Projeto que indica um Código de Ética a programação televisiva no Brasil, e ai, toda a sociedade, alienada por natureza, a quem se diz que escolhe a programação mas não tem capacidade para isso, paga, e paga muitíssimo caro. Contudo, não desanima os diretamente envolvidos, que vêem na campanha e nas iniciativas criadas a partir de 2003 um suporte fundamental para a proposição de uma programação, no mínimo, aceitável em nossa televisão
2. Considerações Finais
Seja qual for o destino das emissoras nos próximos anos, o certo é que muita coisa ainda não será mudada tão de imediato. A pressão política, o terrorismo, a falta de clareza nos diálogos, o jogo de interesse, tudo isso se coloca como empecilho para uma democratização e humanização dos meios de comunicação de massa a curto prazo.
Mas, será que o mundo está realmente perdido? Será que não temos nada mais para assistir? Devemos realmente viver com nossos aparelhos desligados?
Lógico que não! É possível ainda, se assistir a um Cidade Alerta, por exemplo, e tirar informações dele. É possível rir com as pérolas dos participantes dos BBB’s da vida. Dá pra se sentar na poltrona num domingo (de preferência num de chuva) e ver o Faustão tentar ler algo no seu script e não entender o que está escrito, ou morrer de rir por que o Zezé di Camargo não falou tudo o que tinha pra falar por que o Faustão não deu espaço. O problema é que nós sabemos o que deve ou o que não deve ser absorvido. Temos discernimento para isso. Não podemos é ver um senhor que tenha acabado seu relacionamento com a esposa ir a um programinha desses e ser ridicularizado, ou ver uma criança passando fome e sua condição ser usada para enaltecer a imagem de um ou outro comerciante dono de supermercado.
Se aprovado, o PL que visa combater esse afronte pode ser um grande passa para a democratização de vez dos programas televisivos de uma forma geral no Brasil, embora não aborde a questão das concessões. Talvez, por ser ainda muito prematura essa discussão.
Então, com a participação de toda a sociedade civil, dos seus representantes, façamos o utópico (e até parece mesmo) ultrapassar o científico e se tornar uma prática do cotidiano.
BIBLIOGRAFIA
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REBELLO, Aiuri. TVs fazem pressão contra campanha. Brasil de Fato, s.l., 10 de Jun. 2004. Online.
Disponível na Internet: http://www.consciencia.net/midia/eticanatv.html
Publicado por: George Martins da Silva
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